terça-feira, 12 de abril de 2011

O Brasil deveria ajudar Portugal?

O Brasil deveria ajudar Portugal?

A presidente Dilma Rousseff poderia ter recheado a visita a Portugal, na semana passada, com aquele rosário de declarações gentis e soporíferas sobre os laços históricos e culturais que unem os dois países. Colocada diante de uma questão muito mais provocante, porém, ela não recuou. Para exasperação do presidente de Portugal, Cavaco Silva, e do ex-primeiro-ministro José Sócrates, Dilma tratou abertamente da possibilidade de o Brasil ajudar sua ex-metrópole a sair da crise econômica.
Dadas as péssimas perspectivas dos credores de Portugal neste momento, ela ponderou que o Brasil até poderia emprestar dinheiro ao país europeu, se houvesse garantias. E arrematou: “Isso é questão de negociação”. Haveria alguma negociação capaz de tornar razoável a ajuda do Brasil, ainda repleto de problemas estruturais, a um país da União Europeia?
A declaração de Dilma veio dias depois de o jornalista americano Edward Hadas, do jornal britânico Financial Times, sugerir que Portugal se deixasse anexar pelo Brasil a fim de trocar a “velha e cansada” União Europeia pelo “centro emergente de poder global” que são os Brics, o grupo dos grandes países em desenvolvimento. Era piada, claro, mas os portugueses não têm motivos para rir. O ex-primeiro-ministro José Sócrates havia renunciado dias antes da chegada de Dilma, por não conseguir aprovação para seu plano de reação à crise. As agências classificadoras de risco vêm dando a Portugal notas progressivamente piores, num alerta a seus credores.
Torna-se cada vez mais provável que Lisboa tenha de recorrer ao Fundo Europeu de Estabilidade Financeira e ao Fundo Monetário Internacional (opção que o ex-ministro das Finanças Luís Campos e Cunha rotulou como “vergonhosa”) – e os 75 bilhões de euros à disposição talvez sejam menos que o necessário para rolar as dívidas (o país precisa de mais de 20 bilhões de euros apenas neste ano). José Reis, professor da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, desenha um quadro desolador, que une estagnação, ataques especulativos, juros altíssimos, dificuldade de financiamento para empresas e desemprego no maior nível dos últimos 80 anos, acima dos 11%.
O governo brasileiro até poderia encontrar uma forma de emprestar ao país europeu dentro dos limites de risco toleráveis pelo Banco Central, que não ameace o patrimônio pertencente a todo cidadão brasileiro. Mas o gesto seria apenas simbólico, diante da dimensão do problema. Existe, porém, outro caminho, muito mais interessante para os dois países.
Mesmo com o cenário econômico ruim neste momento, Portugal pode oferecer boas oportunidades para companhias brasileiras entrarem no mercado europeu, crescerem e ganharem competitividade. O futuro primeiro-ministro (a ser eleito em 29 de maio ou 5 de junho) deverá propor um programa de privatizações mais ousado do que o pensado por Sócrates, e que precisaria começar em 2012. Um plano assim poderia incluir o todo ou partes de ferrovias, rodovias, serviços de fornecimento de água, bancos e a companhia aérea TAP.
“Portugal tem companhias interessantes, como bancos de porte médio eficientes”, diz o economista e especialista em estratégia empresarial Daniel Motta, professor da escola de negócios Insper. “Mas isso teria de ser uma decisão puramente empresarial, de avaliar oportunidades no mercado europeu.” Quando companhias como Eletricidade de Portugal e Portugal Telecom fizeram compras no Brasil, tomaram uma decisão bem mais fácil, de sair de um mercado maduro de 10 milhões de habitantes para outro, 20 vezes maior e em crescimento. O investimento no sentido inverso exige mais cuidado.
Pode-se confiar na lógica empresarial para reduzir o risco de desperdício de dinheiro em negócios com potencial duvidoso. Essa lógica estaria sob ameaça, porém, caso o governo brasileiro resolvesse agir para incentivar fundos de pensão e empresas a colocar dinheiro em Portugal.
Fonte: Época

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